segunda-feira, 11 de julho de 2011

Médicos da rede pública pedem socorro

Não são apenas os usuários do sistema público de saúde que reclamam da qualidade dos serviços oferecidos. Médicos e outros profissionais da área também sofrem com a falta de condições de trabalho, que, na maioria das vezes, é crucial para salvar a vida de um paciente.

Médicos do município de Boa Vista e do Estado ameaçam cruzar os braços por tempo indeterminado se não tiverem seus pleitos atendidos. E nada tem relação com aumento de salário. Querem mais servidores, equipamentos em perfeitas condições de uso e medicamentos disponíveis para os pacientes.

Se o atendimento por muitas vezes deixa a desejar no Hospital Geral de Roraima (HGR) e no Hospital Materno Infantil Nossa Senhora de Nazareth, que são os mais procurados, vai de mal a pior no Hospital da Criança Santo Antônio, o único na especialidade em Roraima.

A pediatra Elana Almeida explica que atender bem aos pacientes vai além do conhecimento dos médicos. Faltam meios para isso. “Já informamos várias vezes à Prefeitura sobre o desabastecimento do Hospital da Criança, pleiteamos desde o início do ano a aquisição de medicamentos, material médico-hospitalar, manutenção dos equipamentos e contratação dos servidores, mas até o momento não tivemos resposta”, disse.

Para ilustrar quão difícil se tornou salvar vidas na unidade, deu alguns exemplos à Folha. Regularmente, afirma, o hospital fica sem gasometria, “que é um exame importantíssimo para o paciente que está em estado grave na UTI”. “É um exame feito no paciente para sabermos como está sua oxigenação e tomarmos medidas imediatas. Quando não temos, muitas vezes o paciente fica prejudicado”, informou.

Além disso, afirma a médica, faltam sondas de aspiração para os pacientes que estão entubados e falta material para diálise, usado em pacientes que têm insuficiência renal. “Não estamos pleiteando a queda de ninguém, não é uma briga pessoal com o secretário [Robério Araújo] nem diretores, tampouco estamos pedindo aumento de salário. Só queremos atender de forma adequada aos pacientes. Não podemos ir para casa dormir sabendo que um paciente morreu ou pode morrer por falta de uma assistência adequada”, enfatizou a pediatra. Ao dizer isso, é preciso frisar que os pacientes a quem se refere são crianças.

O Conselho Regional de Medicina (CRM) tornou a questão pública com a veiculação de notas em jornais e emissoras de TV, destacando os problemas enfrentados pelos médicos que trabalham no Hospital da Criança e pedindo solução às autoridades.

O presidente do CRM, Virlande da Luz, disse que o hospital sequer tem sabão para que os médicos lavem as mãos. Afirmou que foram realizadas reuniões com o secretário de Saúde, Robério Araújo, Ministério Público Estadual e outros órgãos fiscalizadores, mas os problemas persistem.

Ele observou que equipamentos, principalmente utilizados em cirurgias, precisam de manutenção urgente. Até na UTI, os materiais estão obsoletos. “Todas essas questões geram dificuldades para o trabalho dos médicos. Eles estão numa situação onde a qualquer momento podem perder um paciente e isso vai repercutir em um processo ético no CRM, onde, na verdade, a falha não é do médico, mas por falta de condições de trabalho”, ponderou.

Os médicos, segundo Virlande da Luz, farão uma panfletagem pelas ruas de Boa Vista esta semana, explicando mais detalhes sobre a crise na saúde pública. “A partir daí, se não houver nenhuma reação positiva para resolver o problema, eles entrarão em estado de greve e depois em greve”, afirmou, sem informar datas.

A diferença do que ocorre na saúde municipal para estadual, explica, está na resposta ou no indicativo de resposta que o poder público tem dado para tratar as questões. As condições do HGR e da maternidade estão muito aquém do ideal, porém nos últimos dias, conforme Virlande da Luz, o governo adquiriu equipamentos e medicamentos, além de ter assinado um decreto aumentando o valor do plantão dos médicos de R$ 600,00 para R$ 920,00.

“Fizemos uma fiscalização na UTI e no centro cirúrgico do HGR, que está com extremas deficiências. Também fizemos uma fiscalização no ano passado na maternidade e encontramos diversos problemas, porém há demonstração dos gestores em corrigir”, informou.

O governo vai lançar um edital para implantar uma nova cooperativa em substituição à atual Cooperbras, que terá o contrato encerrado no próximo dia 31 de julho, depois de 20 anos de convênio. Ela abrangerá somente os serviços médicos.

Ainda assim, médicos do Estado ouvidos pela reportagem não se deram por satisfeitos. Afirmam que o que foi feito é “pouco ou quase nada” para atender as necessidades dos pacientes e oferecer serviços de qualidade. E assim como os que trabalham na Prefeitura, não descartam realizar greve.

“Os médicos do HGR suspenderam todas as cirurgias eletivas, porque o centro cirúrgico não oferece condições. Das seis salas, somente duas estão funcionando. E eles só vão voltar a operar quando todas estiverem funcionando. Até agora, tem mais de 1.500 cirurgias para serem feitas. Esse é o primeiro sinal do movimento dos médicos do Estado”, observou o presidente do CRM.


Promotoria de Saúde diz que investiga denúncias

A promotora de Justiça de Defesa da Saúde, Jeanne Sampaio, disse, por meio da assessoria de comunicação, que está acompanhando o caso e que estuda impetrar nova ação civil pública contra a Prefeitura de Boa Vista para que invista em melhorias na saúde pública.

Em 2008, ela ingressou com uma ação pedindo investimentos no Hospital da Criança Santo Antônio. A ação foi julgada procedente e está hoje no Tribunal de Justiça aguardando a confirmação de sentença.

Depois, ela iniciou outra investigação para apurar denúncias que não estavam contempladas na ação anterior. A promotora se reuniu com o prefeito Iradilson Sampaio (PSB) e outras autoridades, onde recomendou que fossem feitas melhorias no hospital e um concurso público para a contratação de servidores. O prefeito, afirma, se comprometeu em atender ao pleito.

Mas, independente da recomendação, Jeanne Sampaio estuda ingressar com uma nova ação civil pública contra a Prefeitura de Boa Vista.



Prefeitura diz que crise decorre da redução de recursos federais

Em nota, a Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) informou que atualmente existe uma crise em todo o país com relação ao Sistema Único de Saúde (SUS), quando as transferências dos recursos federais estão sendo inferiores à real necessidade dos municípios que têm demanda cada vez mais crescente.

Quanto à nota divulgada pelo CRM, a secretaria disse que “a iniciativa de elaboração desta manifestação é de uma minoria dos médicos que compõem o Hospital da Criança e, portanto, não corresponde à realidade”.

Também informou que elaborou um termo de contrato para os profissionais da saúde, que estabelece carga horária, remuneração, hora extra e demais situações trabalhistas. O termo já foi apreciado pela Secretaria Municipal de Administração e Gestão de Pessoas e será encaminhado à Câmara Municipal para votação e aprovação tão logo seja possível.

Sobre a falta de médicos no Hospital da Criança Santo Antônio, a secretaria informou que esta informação não procede. A nota ainda destaca que a administração do Hospital da Criança passou por algumas adequações, com a reorganização da estrutura das coordenações. “A direção do hospital está realizando uma fiscalização mais rigorosa do cumprimento dos horários de chegada e saída dos profissionais, bem como dos plantões, realizando o pagamento conforme o cumprimento dos profissionais”.

Atualmente, observa o documento, mais de 40% da demanda do hospital são de pacientes vindos do interior e dos países vizinhos, Venezuela e Guiana. A secretaria enfatizou que o atendimento de alta complexidade, conforme preconiza o Ministério da Saúde, é de responsabilidade dos estados, ficando a cargo dos municípios os atendimentos de baixa e média complexidade, que fazem parte da Atenção Básica.

Afirmou que o hospital é o único que atende crianças no Estado, no entanto, o Município não recebe recursos estaduais para a sua manutenção. Sobre isto, a secretaria diz que está com diálogo aberto na Comissão Intergestora Bipartite, que conta com a participação de todos os secretários municipais e do secretário estadual de Saúde.

“O município de Boa Vista entende que é necessária a gestão ou o cofinanciamento do Hospital do Estado. Esse também é o entendimento de todos os secretários municipais da Comissão, inclusive do secretário de Estado da Saúde, Leocádio Vasconcelos, que manifestou posição favorável durante as reuniões. Porém, até o momento o Governo do Estado ainda não se posicionou oficialmente com relação a isto”, diz a nota.

A secretaria reconhece que é necessária a realização de concurso público para a Saúde. No entanto, o Município só poderá realizar o certame após a definição da situação do Hospital da Criança.

FUNDO – Segundo a nota, o prefeito Iradilson Sampaio determinou que o Fundo Municipal de Saúde seja gerenciado pela Secretaria Municipal de Saúde e não mais pela Secretaria Municipal de Economia, Planejamento e Finanças. Esta determinação dará mais celeridade aos processos de empenho e licitação para compras de medicamentos e material hospitalar, bem como contratação de pessoal. A reformulação também compreende a contratação de auditor, administrador e contador para gerenciamento do Fundo.

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